terça-feira, 23 de abril de 2013

Eu, "Artista"

Talvez a forma mais eficiente para uma pessoa se elevar e interagir de forma efetiva com seu entorno (e ao mesmo tempo, expor seu mais íntimo interior) seja a expressão artística. Pensando nisso, foi escrito este texto...

Ser artista é uma dádiva, um privilégio e um carma. É lutar às vezes sem arma, em um fardo doce e amargo de um caminho estreito e largo. Um artista é um ser elevado. Às vezes, paralisado, muitas vezes subjugado. Ser artista é ser antenado, ligado e parabolizado. É ver um mundo quadrado, mal temperado e conformado te chamando o tempo inteiro de errado. 

Ser artista é sentir mais. É uma euforia voraz que te mantém motivado e vivo, aliada a uma depressão muitas vezes sem motivo que te derruba e te deixa incapaz, inerte e passivo diante de um mundo mediocremente superlativo. Ser artista é rir, gritar, sofrer e se emocionar. Ser artista é sentir pena, música, cinema. É viver dentro de um tema, um livro, um lema, uma novela rasa ou um eterno dilema. É ser forte, gordo, sem sorte, magro, pobre e corcunda. É deixar de sentir um grande pé na bunda (e saber que em um dia você sobe, e no outro, afunda).

Ser artista é saber escutar não. É insistir, devotar, é quase uma religião. É botar sua carreira na frente da vida. Família, amores, entradas, saídas... Ser artista é saber mudar de roupa, máscara, semblante e feições. É ter o controle de suas emoções (e ao mesmo tempo, sentir o tormento de uma sina onde toda sua emoção é quem te domina).

Ser artista é ser egoísta. É perder os seus sonhos de vista. É sentir um incontrolável desejo de falar cantando, sem que seja em um simples solfejo. É aceitar ser uma criatura insuportável para se dividir um lar, pois sua forma de controlar seus passos exige muito espaço, botando sua vocação na frente de toda e qualquer paixão. É viver em total combustão. É sentir em ebulição. É não conseguir fazer planos sem imaginar sua vida com a arte em primeiro plano. É querer viver incondicionalmente e eternamente com a arte, para a arte e DA arte. É achar que o mundo é terreno, e saber que você é de Marte. 

Ser artista é perseverar em uma tola teimosia, dia a dia, mesmo que o destino, sua mãe ou sua tia digam que isto não passa de uma mera fantasia. É querer sempre mais para seu trabalho, e mesmo que em um ato falho, não desistir jamais. Ser artista é ser estranho, louco, de tudo um pouco. É gostar de estar na contramão por odiar ser mais um na multidão. É fazer de sua vida uma busca constante para deixar um legado criativo, alegre ou instigante – mesmo sabendo que isto possa ser um sonho distante.

Ser artista é estar mais próximo de Deus. É guardar rancor, sofrer por amor, gostar facilmente e criar intermitente. É se apaixonar, questionar, se cansar e largar da pessoa amada, em um ciclo sem fim de quem ama assim, intensamente, inconsequente e vagamente. É fruta verde ou passada. É ser tudo e ser nada. É rir de tragédia, chorar com comédia, sentir sem ter nada. 

Ser artista é pintar, escrever, entrar em qualquer dança. É ter os mesmos sonhos desde criança. É ter bandas, teatros, livros e fatos. É jogar o orgulho no mato por um destino nato. É pagar pato, fugir como rato esperando o pulo do gato. É respeito, disciplina, grito e desacato. É não se encontrar em um emprego convencional, pois para você, isto é anormal. É sentir falta do palco como de um prato de comida. É ver a vida de um palco, e o palco na vida. É gastrite, câncer ou anemia, seja em depressão, seja em euforia. É ser um ímã potente que atrai tudo que vem pela frente (seja bom ou ruim, artista é assim).

Ser artista é canto, grito, é choro e olhar aflito. É buscar um interno sorriso. É a dor do arrancar de um siso. É criar dormindo, chorar sorrindo ou sorrir fugindo. É sexta, sábado e domingo. É estar morto e vivo, sendo um “dependente criativo”. É estar preso a esta alma artística por toda eternidade, pois nossa essência não deve durar uma só existência.

Ser artista é carência, imprudência, é um estoque imenso de vivências. É um corpo que retém memórias, referências e histórias que alimentam seu organismo, seja no céu ou no abismo, em um quase que autismo que retém sua glicose pensando ou tomando uma dose. É a inconstância da energia, é a endorfina em uma dupla via, é tristeza e alegria. Somos muito mais que um simples sonho ou um devaneio. Somos na vida o recheio, o sabor, o tempero e o destempero. Falar desta dádiva e desespero a alguém comum não vai te levar a lugar algum. Nossa mente funciona de um jeito incomum. Nosso cérebro às vezes é forte e lento como o efeito de um rum, e às vezes é “pá-pum”, indo do genial a lugar algum. 

Quer aceitação, compreensão? Quer mais sins do que nãos? Bateu na porta errada. Com a gente, é tudo ou nada. É o real em um conto de fadas Mas nada... Nada ou ninguém determina minha vista. Não sou demagogo, não sou ativista. Só sou um teimoso que exige o gozo num riso jocoso, num aplauso clamoroso ou o sol em um dia chuvoso. Posso ser Lennon, Da Vinci, Kubrick ou o Bozo. Posso ser raso, profundo, casto, profano, piegas, imundo... Mas sou meu início, meu meio e meu fim. Sou assim.

Sei que às vezes me acabo, me podo, me gasto... Mas eu me basto. Ainda que o mundo inteiro queira me tirar na pista, não perca seu tempo, não insista! A porta está aberta. Saia, não volte, desista! Eu sou o que sou, com ou sem show. Eu sou um artista.

(por Daniel Paione)